De que forma podem ser curadas as nossas dores internas? Aquelas que muitas vezes não sabemos explicar, aquelas angústias que parecem tão particulares que ninguém saberia entender? E se alguém dissesse a você que a dança pode ser um bom remédio?
Foi essa a maneira escolhida por um grupo de mulheres para conviver, compartilhar e ressignificar suas dores em Santa Maria. Mas o grupo Amor, Movimento e Dança se propõe a ser muito mais do que um coletivo de dança.
Como elas mesmas se identificam, o AMD é um grupo de dança feminino e coletivo de luta, união empatia, empoderamento e (des)construção do corpo através da arte. Eu acrescentaria um pouco mais: é um encontro com troca de abraços, afetos e talentos, uma espécie de terapia em grupo que busca fortalecer cada integrante que se entrega aos movimentos da dança.
O começo
Tudo começou despretensiosamente, com um pedido especial feito por uma amiga da hoje coreógrafa e diretora do grupo, Milena Colognese, 23 anos. A colega de faculdade Bruna Fani propôs que a amiga desse aulas de dança para ela. Uma estava interessada em dançar, a outra disposta a ensinar. Nesse objetivo, buscaram reunir outras mulheres que também quisessem dedicar um tempo para movimentar seus corpos e dançarem juntas.
– Colocamos em um grupo no Facebook para divulgar para outras meninas interessadas. Mais de 150 se manifestaram. Nos impressionou o interesse de mulheres em um espaço que não tivesse julgamentos, técnicas, cobranças e as opressões que a gente vive – explica Milena.
Inicialmente fazendo os encontros em uma sala da escola Olavo Bilac, os encontros começaram com cerca de 30 mulheres.
– Eu sempre dei aulas para crianças ou bailarinos que queriam levar aquilo como profissão. Foi um desafio, desde o início. A partir de um momento percebemos que os encontros estavam tendo característica de cura. Aí aprendemos a transformar o que sentimos em coreografia. As mulheres foram levando suas mães, irmãs, tias, avós e sogras.
Primeira apresentação
Em abril de 2017, o grupo subiu ao palco do Theatro Treze de Maio pela primeira vez, na apresentação de estreia do coletivo. Na ocasião, coreografaram a música “Triste, Louca ou Má”, da banda Francisco, El Hombre.
A partir disso, uma espécie de chave de virada fez com que o coletivo começasse a atentar mais a problemáticas, como a da violência contra a mulher.
– Por sermos tantas mulheres, com suas trajetórias de vida e suas narrativas, percebemos que essas questões estavam presentes em todos os discursos. As histórias eram parecidas o tempo todo e começamos a nos identificar com aquilo: o fato de me ver na outra mulher e perceber que sentimos a mesma dor por situações diferentes – conta Milena.
O processo de criação da coreografia teve como base os índices de violência contra a mulher no país.
– O processo mexeu muito com a gente. Saber que neste momento tem cinco mulheres sendo abusadas no trabalho, por exemplo, e a cada hora mais de 500 mulheres são vítimas de agressões físicas… Pensamos: esse é o nosso ato de revolução.
Pertencimento
O fato de que o grupo é feito de mulheres que nunca haviam subido a um palco para se apresentar, e isso transformou as apresentações em mais uma conquista de espaços.
– Eram mulheres que nunca tinham dançado, eram mães, advogadas, engenheiras, professoras, que faziam qualquer outra coisa, menos dançar. Elas foram ocupando aquele espaço e com o sentimento de pertencimento: “eu posso estar aqui”. Elas saíram emocionadas, vendo corpos sem nenhuma técnica, sem a perfeição, mas sabendo que queriam fazer parte daquilo. Ficou uma verdade no palco.
Depois disso, o coletivo, que hoje conta com cerca de 25 mulheres, fez e ainda faz várias apresentações em diversos locais. Recentemente as meninas participaram de intervenções em comemoração ao Dia da Mulher, na Praça Saldanha Marinho e na UFSM.
Oficinas e conhecimento
Unindo talentos, o grupo se tornou muito mais do que apenas um coletivo que dança. Cada mulher soma seus conhecimentos em oficinas, como de canto, de teatro e confecção de colares.
– Percebemos que todas poderiam criar de alguma forma e acessar esse poder criativo. Começamos a entrar no sagrado feminino também, conhecer mais sobre isso e todos os assuntos que envolvem o feminino – comenta Milena.
Metamorfoses
É impossível passar imune a experiências de troca como a que o coletivo proporciona. E é por isso que, para Milena, o grupo de mulheres trouxe transformações visíveis.
– Esse convívio me transformou totalmente. Muitas coisas precisei deixar pra trás e outras foram ressignificadas. Estou aprendendo a me perdoar, a me aceitar, por estar entre mulheres. O maior aprendizado é essa conexão, o que essa união tem provocado em nós. Por estarmos juntas, me sinto mais forte, corajosa e determinada, e também me perdoo quando não me sinto assim. Esse é o objetivo: proporcionar um espaço em que todas as mulheres possam sentir, sem culpas e julgamentos, da forma como elas quiserem.
Financiamento coletivo para espetáculo
As meninas estão na reta final de um financiamento coletivo para custear as despesas de um espetáculo, chamado Alvo de Caça. A apresentação já tem data marcada – será em 5 de maio, no Theatro Treze de Maio e envolve mais de 30 mulheres, entre bailarinas e equipe técnica.
A campanha de financiamento recebe contribuições até a quinta-feira. As contribuições, que vão cobrir custos como figurino e aluguel do teatro, podem ser de R$ 10, R$ 20 e R$ 40. Contribua aqui
Para participar
Quem quiser se unir ao coletivo, as mulheres se reúnem sempre às terças, das 20h30min às 22h, e aos sábados, das 14h30min às 16h.
As aulas avulsas custam R$ 17 e, mensalmente, uma vez por semana, R$ 53. Já para participar duas vezes na semana, o valor é R$ 71.
Quem quiser ainda pode fazer uma aula experimental de graça. Para mais informações, entre em contato pelas redes sociais (clique aqui)
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